quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Silêncios


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A minha vida é feita de silêncios
Daquilo que falo e não devo
Do que oiço e não entendo
De tudo o que não dizem os compêndios
Mas sobre os quais eu escrevo
Por vezes ostracizando quem está lendo

O silêncio em meu redor é ensurdecedor
Daqueles que choram por falta de sustento
Dos que não tem alimento do saber
Enquanto outros remoem a dor
Pela falta de um poderoso alento
Ao sentirem que nada podem fazer

Que mundo de silêncios atroz
Que sociedade azeda e amarga enfrentamos
Onde devia haver amor está o ódio
Nosso barco não passa de uma casca de noz
Num mar de ondas em que volteamos
De uma vida que parece um nó górdio

Crianças famintas brincam na rua
Sedentas e andrajosamente vestidas
Olham-nos com temor e estendem a mão
Esboçam um sorriso triste de uma face crua
Já enrugada pelas fortes investidas
De uma vida que apenas conhece o não

O não de uma carência quase total
De vidas esquecidas e amarguradas
Por aqueles que tudo tem e usufruem
Embora sabendo que o seu destino é fatal
Mas não prescindem de pequenos nadas
Para socorrer os que nada tem

Silêncio no negrume de noites malditas
Em que se tornou a vida de muitos seres
Pela falta de pão, amor, justiça, ensino e paz
Algumas das muitas e negras desditas
Que atingem milhões sem haveres
Que o Mundo não cala por não ser capaz

sábado, 10 de outubro de 2009

O pastor


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Pastor que te levantas ao amanhecer
Ainda a noite não se extinguiu
Vês pela janela novo dia a despontar
A chicória está pronta, ainda a ferver
Num prolongado gole ela sumiu
Estás pronto para começar a trabalhar

Desces os degraus da escada a correr
Vais ao curral contar o gado
O cão sentiu e já te acompanha
Abana a cauda só por te ver
É a sua expressão para dizer obrigado
Por mais um dia de campanha

A cancela do redil está aberta
O rebanho atropela-se ao sair
O cão late com grande veemência
Procura manter a ordem e o alerta
Para que nenhuma possa fugir
De uma determinada confluência

Cobertor às costas e de sacola pendurada
Avanças pausadamente terreno fora
Apoiado no cajado com dupla função
Percorres mil caminhos de uma virada
Na procura dos pastos de outrora
Que agora são tão só desilusão

Ao frio e à chuva ou com o calor do sol
Teus dias são sempre iguais
Teu rosto enrugado de vida madura
Revela sacrifícios e penas sem rol
Em trabalho nada parecido com os demais
Mas que é feito de amor e ternura

Conheces todas as tuas ovelhas
Chamas por elas uma a uma
Também o Senhor é Pastor
Sabe e conhece cada uma delas
Tal como tu não perdes nenhuma
Ele as recolhe com todo o amor