quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Ter asas


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Sempre que sinto saudades do passado

Experimento um esgar de dor quase indescritível

É nesses momentos que gostava de ter asas

E planar serenamente na procura de novo prado

Onde o passado fosse presente apetecível

Sem ser consumido pelo fogo dessas brasas

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Como eu te invejo pomba de penas sedosas

Que viajas de aquém para além do infinito

Vens e vais quando ninguém o pode fazer

Por favor, leva minhas lágrimas copiosas

Que brotam de verdade, não minto

E que deixo soçobrar, mesmo sem querer

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Choro por não saber voar para te acompanhar

Queria percorrer terras e mares desconhecidos

Conhecer lugares e pessoas de outras culturas

Encontrar novos seres com quem compartilhar

A felicidade sentida e vivida em tempos idos

E que agora sumiu quais meras agruras

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O presente tem passado, não sei se terá futuro

Mas eu quero vivê-lo de pés assentes na terra

Nem que para isso seja preciso sonhar

Fugir de uma realidade que não aturo

Sentir o aconchego do desejo que me aperra

Mas não impede os meus sentidos de voar

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Vezes sem conta me embrenho no vazio

Sinto-me oco só de pensar em atravessar a ponte

Aquela que ainda liga o ténue sentido da vida

Que ocupa meus pensamentos e eterno desafio

Mas nunca esquece o longínquo horizonte

Mesmo que não passe de vã ilusão sentida

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Pudera eu transformar-me em anjo

E sentir as delícias do espaço etéreo

Certamente que deixaria de sonhar e pensar

A realidade estaria consumada e seria benfazejo

Jamais ousaria rejeitar a vida em concorpóreo

Sendo esse o desejo final sem qualquer pesar

Nota: É com prazer que volto ao convívio de todos após alguns meses de interregno. Obrigado a todos os amigos/as que fizeram o favor de continuar a visitar o meu cantinho. Em breve iniciarei as visitas que serão não só de agradecimento, mas também para matar saudades desta ausência. Obrigado

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Nascer, viver, morrer


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Para traduzir com lucidez o sentido da existência

Seria correcto utilizar uma imagem coerente:

“Nascer, viver e novamente recomeçar”

Porque do acto de nascer não tenho consciência

Contudo há a essência da vida que não o desmente

Já diferente foi o caminho de um lento vivenciar

***

Da meninice recordo episódios isolados

Onde persistem sentimentos de abandono

De fuga ao quotidiano de menino pobre

Onde inocentes brincadeiras foram aliadas

A uma camaradagem franca e sem retorno

Mas cuja lembrança tem um sabor nobre

***

Nos longos anos que marcam a minha vida

Há tantas histórias, amores, mentiras e verdades

Tudo isso não passa de uma amálgama de emoções

Que foi condimentada de forma sentida

Onde a ausência do antídoto contra as maldades

Abriu caminho a muitas e servis tentações

***

A vida devia ser uma festa permanente

E não é porque nós não acreditamos

Naquilo que pretendemos e queremos

Eu deixei a vida deslizar serenamente

Percorri longas avenidas ladeadas de álamos

E contornei os caminhos agrestes e ermos

***

Os anos da juventude foram belos e fogosos

Mas quantas vezes me impediram de ver

Retiveram o meu imenso desejo de escolher

Porque não conhecia outros sois radiosos

Que certamente me teriam feito aceder

Aos altares celestes de um outro saber

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Agora que a luz da vida está prestes a apagar

Penso tranquilamente em tudo que queria e não tive

Afinal era dispensável, porque consegui ser eu mesmo

Neste corpo efemeramente cedido que irei entregar

Só ficarei com a alma que sempre sobrevive

E que me levará ao encontro do Bem Supremo

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Liberdade do poeta


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O poeta é humano, mas livre e sem peias

A sua liberdade voa com a volúpia dos ventos

Apenas fica aquém da vontade do Deus Criador

Por que é um ser centrado na procura de panaceias

Apesar disso pode esquecer tais momentos

E ter ele próprio o papel de homem libertador

*

Sou pobre de condição que humilde poeta encarna

Não tenho desejos de riqueza, lisonja ou afins

Sinto e desfruto da felicidade do pensamento

Com ele tudo alcanço, pois dele tudo emana

Tanto posso estar ao lado dos anjos Serafins

Como sentir o demónio enquanto tormento

*

A força dos poderosos deixa-me indiferente

Eles não podem vergar a minha imaginação

Não sinto ódio, só pesar pela sua desdita

Seu domínio tudo arrebata sem deixar semente

Esquecendo as enormes ondas de indignação

Dos atingidos pela sua acção maldita

*

A felicidade deste mundo é ténue e passageira

Mas todos nós a buscamos desenfreadamente

Há pessoas com a ilusão de que a encontraram

Eu sinto a poesia como uma suave passadeira

Pela qual posso atravessar a margem placidamente

Ao encontro da vida que outrora me prometeram

*

O poeta diz o que sente ou aquilo que pensa

Pode ser a verdade ou utilizar a imaginação

Usa a escrita como arma ou princípio de paz

A sua liberdade assumida tudo condensa

O que escreve pode não passar de ficção

A arte da escrita está no segredo daquilo que faz

*

A liberdade do poeta é única e intransmissível

Só ele tem o coração pronto para a albergar

O seu dom está na transmissão dos sentimentos

Por amor e para o amor, eu sou fiel e sensível

O meu espaço de liberdade será sempre um aconchegar

Para os que anseiam pelo amor em todos os momentos

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Chovendo


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De pés descalços seguia pelo caminho
O frio penetrava-me intensamente
Uma chuva miudinha escorria pela face
A camisa ensopada até ao colarinho
Enregelava meu corpo incessantemente
Sentia-me mais molhado que uma alface

Olhei para o céu e comecei a pensar
Vou andar mais depressa, vou correr
Talvez consiga chegar a um abrigo
E então poderei finalmente descansar
Aliviar um pouco este meu sofrer
Pois penso não merecer tal castigo

Na precipitação da marcha acelerada
Escorrego e caio desamparadamente
As palmas das mãos rasparam na areia
Vi que uma delas estava dilacerada
Gotas de sangue brotaram repetidamente
Tinha que procurar uma panaceia

O frio passou como por encanto
A dor era agora o esgar do meu sentir
Soergui-me imerso em mil pensamentos
Estava triste e soltei um leve pranto
Confesso a fraqueza, não sei mentir
Sou um homem de sentimentos

Retomei a caminhada, agora sem tino
Não sabia para onde ia ou o que queria
Vislumbrei um vulto ao longe e aguardei
Já não sabia o que fazer, parecia um cretino
Esperei curioso para ver quem seria
E na borda da passagem me sentei

Um homem de bastante idade e mal vestido
Fitou-me longamente com alguma compaixão
Amigo está ferido? Perguntou delicadamente
Sim, respondi meio atordoado e sem sentido
Ajudou-me a levantar e deu-me a mão
Pensei para comigo: é um anjo certamente








terça-feira, 5 de abril de 2011

Primavera sempre


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Primavera não é apenas uma estação temporal

Que sendo bela, não abarca toda a sua plenitude

Primavera é um estado de espírito empírico

Que se sente de uma forma natural

Ela é como mulher bonita adornada de virtude

Que se deixa embalar em melodioso canto lírico

*

A primavera jamais perde a sua beleza

Seja nas flores que despontam no campo

Ou no acto do nascer de uma criança

Porque quando floresce uma nova certeza

O seu destino é incerto como o tempo

Mas os raios de sol são o dealbar da esperança

*

As águas agitadas do Oceano são tépida primavera

Quando se enleiam e regurgitam suavemente

Espraiando-se num amor plácido incontido

Mas que está em qualquer lado à nossa espera

Aguardando a chegada de alguém ausente

Com febre de amor desejado e sentido

*

Primavera é o sentir da vida de um ancião

Que percorreu um caminho sem retorno

Feliz pelo que soube fazer sem lamento

E que agora exaspera com a chegada da solidão

Aspirando pelo provir de um dia morno

Para apagar o fogo de outrora a cada momento

*

Panóplia de seres marinhos é primavera

Que povoa as profundezas dos Oceanos

Que nadam perdidamente sem fim à vista

Mas renovam o círculo de vida efémera

De tantos milhões de seres humanos

Que nunca perderam o desejo de conquista

*

Primavera é sempre quando nós queremos

Porque faz parte do que é certo e imaginário

Ela é intrinsecamente inseparável da vida

Da criancice até ao termo da velhice voaremos

Em corcel percorrendo um caminho binário

Na estrada invisível de uma vida haurida







quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Coração amarfanhado


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A você entreguei meu coração
Me senti feliz durante tempo infindo
Apenas conhecia uma ventura inaudita
De manhã acordava e pedia em oração
Que você continuasse sorrindo
E que à minha porta não batesse a desdita

O tempo foi esvaindo lentamente
Os dias eram aspergidos de luz e emoção
As noites eram dias de lua cheia
Ambos juramos com fé solenemente
Que nossas vidas seriam um único torrão
Como que espessas camadas de geleia

Trilhamos caminhos desconhecidos
Viajamos por terras que ninguém conhecia
Os oceanos foram estreitos rios
De águas tépidas e leitos adormecidos
Onde assentamos a nossa soberania
De uma harmonia sentida sem desvarios

Quantas noites de luar nos aconchegaram
Quantas estrelas longínquas nos protegeram
Imensas legiões de anjos nos guiaram
Nossas almas felizes alegremente choraram
Longe de esquecer o que outrora prometeram
Enleadas no bálsamo daqueles que sempre amaram

O que vivemos foi intensamente belo
Eternamente merecedor de ser recordado
Mesmo que a memória se dilua
Ficam os sentimentos como selo
De um contrato feito e herdado
Que perdurará para além da meia-lua

Estranhos sentimentos agora me assolam
No finar de uma vida que foi só nossa
Parece que tudo não passou de um sonho inventado
Sinto a falta das tuas mãos que consolam
Verto lágrimas salgadas que fazem mossa
A um coração que ficou amarfanhado